Esses últimos dias, recebi algumas perguntas, reclamações, de clientes e acho legal compartilhar essas dúvidas com vocês.
Um cliente ficou preocupado porque a lateral da rolha estava toda vermelha, tingida pelo vinho… “Será que a garrafa estava vazando e a rolha vedando mal? O vinho foi prejudicado?”
Pode ficar tranquilo, a resposta é não.
Quando do engarrafamento, a máquina enche a garrafa até o nível desejado, predeterminado.
Depois, é inserida a rolha, pela mesma máquina, com certa pressão.
Depois, a garrafa é lavada com um jatinho de água quente, antes de receber a capsula e ser rotulada.
Pode acontecer que a regulagem para o nível do vinho na garrafa ultrapasse um pouco o normal e, nesse caso, com a pressão da colocação da rolha, um pouco do vinho “a mais” é projetado para cima, ficando exprimido entre o vidro e a rolha. Feito, vai dar coloração a rolha.
Se quiser verificar, pode cortar a rolha em dois e perceberá que não tem nenhum vinho atravessando ela.
Atenção, se o nível na garrafa está abaixo do normal, aí sim tem um vazamento e problema! Também se perceberá a marca do vinho que escorregou na garrafa.
Atenção, no caso de vinhos muito antigos, o nível na garrafa pode abaixar pela simples evaporação, a rolha deixa o vinho respirar.
Isso é normal e acontece com vinhos de vinte anos ou mais…
“Quando cortei a capsula, a rolha estava toda mofada! Até úmida…”
A priori, sem problema.
Como diz acima, a máquina lava a garrafa antes de receber a capsula.
Se a rolha tiver sido inserida com um pouco mais de força e ficar um quarto de milímetro a mais para dentro da garrafa, cria-se um espaço onde a água vai acumular.
Essa umidade favorece a aparição do mofo.
O mofo não tem contato com o vinho e não pode contaminá-lo.
De novo, pode fazer o teste de cortar a rolha pelo meio e perceberá que nada atravessou…
Muitas adegas são bem úmidas e apresentam mofo, até musgo, nas paredes… Não há risco para o vinho.
É melhor ter uma adega úmida do que seca demais, caso contrário, força a evaporação do vinho.
Clássica nos grandes vinhos tintos, a borra (depósito) é mal percebida nos vinhos brancos.
As borras são micro partículas de uva e leveduras mortas. Elas contribuem para a riqueza aromática do vinho.
Com o tempo, há uma decantação natural na garrafa e o depósito fica na lateral dela.
Quando se coloca a garrafa em pé, a tendência é que se desloque para o fundo da garrafa.
Antigamente, praticava-se a colagem do vinho com clara de ovos para decantá-lo e precipitar essas partículas no fundo da cuba. Depois, havia filtração para eliminar tudo.
Nos anos 70, um vinho que não fosse totalmente translucido não podia pensar entrar no Japão!
Infelizmente, era um vinho “magro”, despido do que lhe dava riqueza aromática.
Felizmente, esses tempos passaram, percebeu-se que esse leve depósito contribui para realçar a qualidade do vinho.
Aliás, é o princípio da criação sobre borra, muito praticado com o “Muscadet sur Lie”. Nesse caso, associado ao “batonnage”, a ação de remexer essa borra para melhor extrair aromas.
Os filtros antigos foram aposentados e substituídos por filtros menos agressivos, de terra ou de placas que deixam passar as partes mais finas da borra.
Quando se tem um vinho “qui dépose”, é bom manipular a garrafa com delicadeza para evitar misturar a borra e enturvar o vinho.
Se o deposito é muito importante, aconselho usar decantador e parar antes de remexer a borra.
Dica: Para não desperdiçar o resto, pode usar um filtro de café para separar o liquido do grosso da borra. Dessa forma, guardará mais uma taça para degustar na cozinha!
É melhor não fazer esse resgate no decantador, porque haverá passagem de um pouco das partículas mais finas, enturvando o precioso liquido.
Enfim, farei uma observação sobre uns vinhos que apareceram nesses últimos anos no mercado, autonomeados “não filtrados” e que acumulam uma borra espessa de vários centímetros na garrafa.
Estou falando de mais de um copo de borra!
Desculpe-me, mas, nesse caso, não é mais um depósito e sim um erro do produtor que não operou uma decantação correta na cuba ou que tirou demais no fundo da cuba para engarrafar.
Alguns espertos abusam dos ingênuos, explicando que faz parte dos vinhos naturais ou outras explicações fajutas.
Espero que essas dicas lhe tragam tranquilidade nas suas degustações.
François Dupuis
Selecionador de vinho do Club du Taste-vin, desde 1992.